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As Bibliotecas Digitais: Uma Entrevista com Ednei Procópio

A experiência de leitura é, ao contrário do pensamento comum, uma experiência social. A integração entre regiões, culturas e indivíduos em um só ambiente, seja público ou privado, já faz parte da realidade literária há alguns séculos. Com o livro digital, tal coisa não vai mudar. Até mesmo o PC, está deixando de ser o único meio de acesso do futuro leitor. E como isso vai funcionar com o principal local de contato da literatura, a biblioteca?

Conversamos com Ednei Procópio, Coordenador Geral do Cadastro Nacional do Livro, membro da Comissão do Livro Digital da Câmara Brasileira do Livro – CBL e que está ministrando o curso O Livro na era Digital: edição e suportes neste mês.

Leia aqui:

Aletria: O governo é o maior comprador de livros no Brasil, através de editais. Durante um bom tempo, as editoras se adaptaram a esse modelo e prepararam seus livros para as compras governamentais. Com os programas do governo para baratear o livro e aberturas de biblioteca em todo país, você acredita que as editoras também tentarão produzir livros para atender a demanda das bibliotecas? De modo geral, que tipo de livro é favorecido nas novas bibliotecas e quais tipos existem demandas o mercado ainda não é capaz de suprir?

Ednei Procópio: O Governo ainda está quebrando a cabeça para um modelo de distribuição de livros digitais para as bibliotecas públicas digitais. Ou seja, embora o Governo possa iniciar a compra de eBooks para a bibliotecas, via edital, ainda não há um modelo de empréstimos que resolva tanto o acesso do usuário quanto a questão desta distribuição em si. Quando o Governo lançar um edital para a compra de livros digitais é claro que as editoras terão interesse em vender licenças de livros digitais para este cliente. Mas as editoras também ainda não sabem como atender a esta demanda. Porque elas não conseguem entender como os livros serão entregues aos leitores finais. O fato de o Governo permitir o acesso gratuito aos livros digitais não quer dizer que estes livros não tenham sido licenciados. E se foram licenciados, como seria o acesso? Via download, que depois expira, ou via leitura online controlada?

Aletria: Como funcionaria o empréstimo de e-books em bibliotecas? O que seria necessário para implementar o empréstimo de e-books em todo Brasil?

Ednei Procópio: Não existe ainda um modelo padrão e eficiente para o empréstimo de livros digitais via e-bibliotecas. O que existem são pilotos na França, Estados Unidos, etc. E não sabemos se estas soluções seriam eficientes para o leitor brasileiro. A solução técnica para esta demanda seria a instalação do que eu chamo de um eBook Content Server, baseado em Social DRM, que faria o tunelamento desde o servidor até o hardware do usuário. Se um dia houver uma central distribuidora de livros digitais para as bibliotecas públicas digitais seguindo este modelo, haverá um ganho não só para as editoras e autores, como também para as próprias bibliotecas e usuários.

Aletria: O governo brasileiro adquiriu equipamentos para a leitura de e-book, mas você acha que esta é a prioridade da nossa sociedade para que a leitura de e-books possa crescer no Brasil?

Ednei Procópio: O hardware é o item mais supérfluo e inútil que o Governo possa adquirir neste estágio em que estamos. A prioridade sem sombra de dúvidas ainda é o conteúdo. O conteúdo é a alma do negócio, tanto dentro da iniciativa privada quanto para o poder público. O segredo do livro digital não está no hardware, que são mutáveis e praticamente descartáveis, mas naquele outro item primeiro: o conteúdo. E quem realmente irá definir aonde o livro será acessado e lido é o usuário, o consumidor, o leitor. Portanto é preciso voltar aos verdadeiros valores iniciais que compete ao poder público perceber.

Aletria: Em geral, o uso de computadores é relacionado com o conforto do acesso domiciliar e do espaço digital. Na Europa o fechamento de livrarias e bibliotecas tornou-se uma tendência. No Brasil, país onde não existem ainda leitores o suficiente, a existência das bibliotecas é importante para o trabalho direto com a população. Há o risco de repetirmos a tendência Européia? Seria melhor evitá-la ou segui-la? Por quê?

Ednei Procópio: As livrarias estão fechando por falta de um modelo de negócios eficiente na era digital, e não por causa dos eBooks. O mesmo ocorre com as bibliotecas físicas. É preciso antes de tudo de um modelo de sustentação. Frente às novas demandas criadas pela tecnologia da informação, as bibliotecas físicas têm um grande desafio no horizonte. A pergunta que às vezes eu me faço é: “Qual poderia ser um novo modelo para as bibliotecas físicas, dentro de um eventual cenário onde imperaria a digitalidade da informação automática?”.

Não dá para pensar na biblioteca apenas como repositório de livros impressos, inacessíveis, em áudio ou eletrônicos. Há outras questões envolvidas com relação ao modelo de manutenção das bibliotecas que passa pela questão financeira e de sua própria sustentabilidade.

Sendo físicas [feitas de átomos], e não digitais [feitas de bits], me parece que as bibliotecas estão se tornando talvez mais ‘pesadas’ e caras [principalmente se comparadas com a portabilidade permitida pelas novas tecnologias]. Nesse sentido, a criação e a manutenção de bibliotecas com livros impressos em hardware papel, estariam cada vez mais ligadas aos novos modelos sociais sustentáveis, àqueles que se assemelham aos grandes centros culturais, como os museus que atraem público através de eventos com uma agenda cultural ativa.

O que eu tenho certeza é de que o futuro do livro não é somente o digital não. O futuro do livro é o híbrido, ou seja, o livro terá o seu conteúdo trafegando em diversos suportes ou mídias. Seja em hardware papel ou em dispositivos móveis, e até em versão áudio.

Mas, o importante é que, independente do suporte, formato ou mídia que o livro trafegará, as bibliotecas físicas precisam reinventar o seu ‘negócio’ urgente para continuarem existindo.

Aletria: Você oferece um curso, O Livro na era Digital: edição e suportes, e um dos tópicos é Números do mercado e entraves. Pode nos falar um pouco desses números e desses entraves?

Ednei Procópio: O hardware, ou seja, o suporte físico da leitura não me parece mais um entrave, pois a base instalada dos equipamentos vem num crescente. O principal entrave é ainda é a questão da conexão, que é baixa, cara e lenta. E o conteúdo, claro. Pois sem o conteúdo não existem os livros. Do mesmo modo que existe um fetiche pelo papel, existe também um fetiche pelas pranchetas eletrônicas. É preciso concentrar em questões mais prioritárias estrategicamente falando, como o conteúdo e a conexão.

Publicado originalmente em Aletria

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