Diante de tantas perspectivas, oportunidades e desafios, saí do 4º Congresso Internacional CBL do Livro Digital convencido de uma ideia que há tempos me perseguia. Não sei se é maluca. Talvez não, se o que vier a seguir fizer algum sentido às centenas de amigos que acompanham este espaço de ideias há algum tempo.
Eu, que venho trabalhando com os livros digitais desde a época em que uma plataforma pioneira, a Rocket eBook, foi lançada por uma startup do Vale do Silício, a NuvoMedia, sinto como se um longo ciclo estivesse finalmente se fechando; sinto como se um novo e grandioso arco de ideias estivesse finalmente se formando no futuro.
Não consigo mais manter posição de amador, no sentido mais preciso que este adjetivo poderia me representar, frente a revolução pela qual o mercado editorial passou depois daquele momento que considero tão histórico, em 1998, quanto a chegada do Kindle, em 2007. Mas já estamos em 2013, os eBooks estão se tornando populares, e, desde então, venho decidido de atividades que me fizeram perceber as ideocracias de um mercado vezes preso a uma cultura baseada na predominância de dogmas políticos.
Não tenho felizmente talento para política, prefiro fazer negócios. Tanto como espectador, testemunha ocular, personagem ativo, quanto entusiasta de vários projetos editoriais, percebi o quanto ainda preciso aprender, e compreender, não sobre o mercado, pois este já não me causa mais tanto assombro se comparado aos humanos que nele atuam. Estes últimos sim ainda me causam muitas vezes confusa estranheza, tal a percepção que guardo sobre eles. E eu às vezes até me sinto um pouco como se me assemelhassem, como se aquele ditado “me diga com quem andas que eu te direi quem tu és” fosse atualmente a única das verdades.
Há pouco mais de um ano, porém, tenho me negado a uma insistente ideia, como diria um dos personagens de Machado de Assis “malditas ideias fixas“, de colocar em prática a criação do Consórcio do Livro Digital, que agregaria, em um pool com diversas empresas, numa espécie de coworker virtual, o objetivo de acelerar o crescimento do mercado de eBooks. Algo que a princípio poderia dispersar ainda mais talvez o já tão disperso mercado de livros no Brasil.
Coworkers
Nenhuma outra ideia atingiria em cheio, porém, minha ambição no mundo dos livros digitais, pois algo que fizesse dar mais sentido a este mercado poderia ser proposto. E nenhum outro desafio me faria renovar o espírito ante àquela sensação pouco honrosa de que tudo à respeito do assunto eu já ouvi dizer. E não é que eu não me contradiria diante de uma evidente vaidade, mas é que os limites para o mercado de livros digitais também cria um vislumbre até para os que pouco sabem do assunto.
A ideia de uma organização, um consórcio de exploração de negócios, agregado, voltado exclusivamente aos livros digitais e às empresas que neste mercado pretendem atuar, embora pareça talvez antagônica, por eventualmente abarcar empresas concorrentes, poderia no melhor dos mundos, do contrário, evitar aquele tipo de informação interesseira no processo; fortalecer projetos, evitar que apenas alguns poucos oportunistas tirem proveito para si próprio do que poderia ser compartilhado com todos.
Um consórcio voltado exclusivamente ao tema poderia criar um novo viés de ideias, uma nova oportunidade de parcerias, mais próximas àqueles que pretendem de verdade empreender.
Não que seja mais importante eu considerar o que vem a seguir depois desta minha ideia, pois eu sei que antes de tudo olhares desconfiados me seriam dirigidos, uma vez que o melhor seria, a esta altura do campeonato, eu ficar na minha. Pois teria que explicar o viés não político da iniciativa, e deixar bem claro que se trata de business.
Mas eu, que sempre compartilhei tudo o que eu aprendi sobre o tema, só precisaria verificar se a tal da democracia aceita realmente a liberdade de uma expressão. Gostaria de verificar se o mercado editorial aceita que o ser humano é tão limitado quanto o maior de seus limites.
O compartilhamento de negócios
Hoje, o maior limitador das empresas é o seu alcance àquele conhecimento que gera capital. E é por esta afirmação que eu declaro, já sem refutar a ideia do consórcio, que o livro, verdadeiramente, não poderia morrer enquanto negócio. Não importa o tempo, não importa o espaço, pois o modo mais eficiente de acumular e compartilhar conhecimento ainda é através dos livros.
Acostumado, já prevejo alguns que se revezarão na interminável mania de rejeição, protesto, negação e crítica desta ideia de se criar um consórcio. E eu ainda preciso pensar melhor antes de seguir adiante, pois sei que, neste exato momento, alguém está pensando a mesma coisa que eu. Outros tantos, porém, já estão se fazendo as boas perguntas.
Elaborar as perguntas certas para empreender e fortalecer projetos e iniciativas em um novo mercado me parece mais eficiente do que tentar obter todas as respostas. E as perguntas certas são as que devem ser feitas para que ganhemos um mercado sadio, voltado para as empresas brasileiras.
E quem poderia elaborar estas perguntas, se as respostas descobertas devem ser compartilhadas com todos e não somente por aqueles canais de interesses reconhecidamente particulares?
Conceitos fundamentais existem em todas as áreas do conhecimento humano, que podem ser aplicados ao dia-dia dos negócios editoriais. Dominar os conceitos fundamentais de um negócio voltado aos livros digitais é mais eficiente do que tentar saber tudo sobre tudo. E quem poderia estabelecer tais conceitos, se não podemos deixar de reconhecer que parece faltar foco a maioria dos empreendimentos, se parece faltar tempo até àqueles que poderiam liderar um novo modelo de negócios para este mercado?
Por um novo modelo mental
Os conceitos fundamentais dos livros digitais precisam ser levantados, referenciados e amplamente divulgados para serem reconhecidos e usados pelas empresas e empreendedores envolvidos com o desenvolvimento deste novo mercado em nosso país. As micro e macro tendências não devem ser usadas apenas por meia dúzia de canais que só traduzem os que lhes interessa.
Este meu intento, que fique bem claro, não é nenhum tipo de manifesto, ou algo que o valha, embora não me faltasse vontade de descrever em amiúde as tantas contradições que percebi por aí. E em apenas um blog não caberia. O que importa na verdade é que hoje o que cerca os profissionais envolvidos com o antigo modo de se escrever, publicar, comercializar e divulgar livros é a incerteza. Mas a incerteza, está nos livros, é administrável. A incerteza só não será administrada se o medo, a insegurança e a incapacidade de se locomover diante as transformações da vida profissional tomar conta do nosso espírito humano.
O empresário Ivoncy Ioshpe dizia que “o menor prejuízo é aquele que você já conhece“. Mas como administrar incertezas, senhor Ioshpe, se boa parte das organizações do livro no Brasil, e eu não me refiro a nenhuma em particular, de tantas que são, se limita em seu dia dia a uma política de interesses intermitentemente [im]pessoais, cujas agendas não são compartilhadas com àqueles projetos que precisam, com àqueles que efetivamente necessitam de suas ações? E o que sobra para o mercado, incerto, frente a um mundo ao mesmo tempo vislumbrante e vislumbrado, é a certeza de um risco.
Mas é preciso mais do que coragem para desbravar um novo mundo, e é preciso uma força motriz, intensa, genuinamente independente, que faça desaparecer esta sensação de instabilidade. Alguns poderiam refutar que a criação de um Consórcio do Livro Digital é um risco. Mas riscos, eu aprendi em um livro, são minimizáveis. Os riscos existem para que possamos dar o próximo passo. E o próximo passo a ser dado para aproximar pessoas e ideias ao redor de uma necessidade comum, como por exemplo desenvolvimento de plataformas e formação de catálogos, poderia ser exatamente este: criar algo novo.
Criar algo novo, para fortalecer um mercado novo
Sou partidário das ideias transformadoras, mas minha principal motivação seria a de que o Consórcio do Livro Digital, já com a aprovação de cerca de dez empresas, se fosse levado adiante, não se tornasse em nenhuma sociedade secreta. E para minimizar riscos e incertezas neste sentido, se faria necessário concentrar tempo e energia nas coisas que considerarmos realmente úteis.
É útil, por exemplo, pensar no modo como iremos entregar o nosso conteúdo em forma de livros e criar demanda aos milhares de consumidores que se aglomeram, se concentram e se dispersam na grande rede mundial de leitores através de soluções, serviços e produtos digitais. É útil firmar o conhecimento como fundamental para se beneficiar dos networkings que uma associação de ideias e pessoas pode criar. É útil conceder planos e prioridades aos projetos editoriais voltados ao mercado de livros. É útil estabelecer parcerias com os pares em quem confiamos.
É útil ser útil
Agora, é útil continuar tentando manter uma comunicação mínima que seja com aqueles que se acham acima do bem e do mal? É útil criar oportunidade de negócios com ímpares que só enxergam a si próprio? Na verdade é triste ver o quanto muitos se revezam na tentativa fútil de ser a única plataforma de eBooks dominante no mundo. Tem gente achando que pode ser o único distribuidor de água do deserto. E este, verdadeiramente, não é o caminho.
Se faz útil, acima de tudo, enfim, a reunião de um novo empreendimento, que se renova, de uma nova cadeia de valor, que se reforma. É preciso respeito com as empresas pares. É preciso ética nos negócios. E se tudo isto parece estar em desuso, por um novo modelo mental é que eu estou me tendenciando a criação do Consórcio do Livro Digital que pode parecer a princípio algo fora do seu tempo, mas que daqui há algum tempo porém poderia ser não só importante como imprescindível.
E eu não falo do ponto de vista dos “pequenos”. A gente sempre houve essa conversa por aí, nos corredores: ah, porque fulano é pequeno, beltrano é pequeno. Sob a égide do consórcio, muitas oportunidades poderiam ser criadas para as empresas envolvidas não importa o tamanho. Poderia haver ações contínuas por exemplo para facilitar o acesso das empresas brasileiras às notícias, novidades, tecnologia, pesquisas, números, padronização, legislação, plataformas, enfim, informações ricas e precisas sobre os livros digitais, do mundo para o Brasil e deste para o mundo. Sem politicagem, sem restrições, sem censuras, sem constrangimentos, concorrência ou benefício diretos a essa ou aquela empresa, pessoa ou instituição.
Estes dias eu estive pensando o quantos alguns canais escrevem notícias diárias sobre os eBooks apenas para deixarem a sensação de que têm algo a dizer. Mas, às vezes, quando não se tem algo realmente importante a se dizer, e ao invés de falar o tempo todo de si próprio, é melhor não dizer nada. E é este esforço que eu estou fazendo à partir de agora para não cair em um discurso vazio.
Agradeço aos que sempre visitam este espaço. Vocês não perdem por esperar pelo próximo espaço, mais rico, que pretendo criar. Em um futuro bem próximo, vamos dar tempo ao tempo, o consórcio poderia criar uma nova via de conversas sobre os eBooks. E eu adoraria, usando um termo hype, virar o disco. Neste futuro estão projetadas as minhas mais nobres causas. E é vislumbrando este futuro que eu encerro por aqui citando aquele poeta de ideias malucas: “eu prefiro ser esta metamorfose ambulante do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo“.