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A disruptura do Mercado Editorial mundial

O uso da tecnologia se disseminou a tal ponto que o desafio agora é com relação ao consumo dos livros num mundo pós-pandemia.

Por Ednei Procópio

Há uma disruptura no mercado editorial mundial ocorrendo neste exato momento. Muito pensam que a pandemia do novo coronavírus seria a responsável pela mudança no hábito de consumo, acesso e leitura dos livros, mas o isolamento social necessário, na verdade, está sendo um acelerador desse processo. A causa da disrupção ocorrida no mercado editorial mundial é e sempre foi a Internet e as suas conexões por meio das tecnologias voltadas ao consumo.

Não podemos nos esquecer de que, mesmo antes da pandemia, a Internet, em seus pouco menos de quatro décadas de existência, já vinha rompendo de modo devastador com toda a cadeia produtiva, econômica, criativa e cultural do livro. Enquanto que há cinco séculos e meio, a prensa aprimorada pelo gênio alemão Johaness Gutemberg causou a disruptura no modo de se registrar e compartilhar livros no mundo medieval, a Internet foi responsável por uma descarga disruptiva capaz de criar um novo cenário no universo literário.

O mercado editorial sempre viveu dos ciclos causados por inovações; ora tecnológicas, no caso das máquinas de impressão, ora pelas inovações da própria mídia desde a evolução dos modos de comunicação através do rádio, da tevê, da microcomputação e, mais recentemente, das mídias sociais. A pandemia do novo coronavírus, por sua vez, acelera o início de um novo ciclo, de um novo estágio para mercado criativo literário. Em um cenário pós-pandemia, a Internet força ainda mais o aumento tanto da capacidade de armazenamento dos livros, quanto do processamento e velocidade dos aplicativos nos smartphonestabletse-readers e em uma miríade de superfícies de leitura.

A Internet possibilitou um cenário onde as empresas que trabalham com livros pudessem ao mesmo tempo romper com a velha e enferrujada engrenagem de se publicar e vender livros; enquanto que as demandas sociais da pandemia do novo coronavírus criou um novo cenário de consumo e leitura dos livros para um mercado consumidor cuja curva de aprendizagem, na utilização das tecnologias, está sendo rápida e rasteira.

Enquanto que a prensa de Gutemberg levou décadas para alcançar os antigos feudos da Europa medieval desde a Alemanha até chegar à França e outros países como Portugal; a Internet levou poucos anos até que saísse dos laboratórios e avançasse na academia, univerdades e empresas. E todas as aplicações que dela resultaram estão agora permitindo uma transformação social sem precedentes. Assim, aqueles cases todos que um dia foram testados para o avanço dos livros eletrônicos, mas que não vingaram apenas por estarem a frente do seu tempo, agora, em um mundo pós-pandemia, podem ser novamente testados.

O livro “Big Bang Disruption: Strategy in the Age of Devastating Innovation”, em tradução livre “A Ruptura Big Bang: Estratégia na Idade de Inovação Devastadora”, afirma que “nenhum produto ou serviço antes divulgado e vendido através das mídias tradicionais passam impune pela devastadora inovação causada pela Internet”. Segundo os autores da obra, qualquer empresa do ramo editorial, por mais start-up que seja, pode tornar-se devastadora do dia para a noite simplesmente oferecendo algo melhor e, na maioria das vezes, mais acessível que seu concorrente antecessor.

Antes da pandemia do novo coronavírus já existia no mercado editorial uma sobrecarga de livros em detrimento dos mesmos e sempre poucos leitores. Então, como as empresas do ramo editorial podem aproveitar o poder deste rompimento atual, onde as massas aprendem por si só a usar as tecnologias digitais, sem precisarmos aguardar sua natural curva de aprendizagem?

Os produtos e serviços baseados em softwares de um modo geral, mas aqui em nosso caso os livros baseados em aplicativos, tendem, em médio prazo, substituir produtos físicos como os livros impressos. Não em preferência de consumo, mas em termos de viabilidade econômica, barateamento na produção e acesso facilitado no consumo. As empresas do ramo editorial estão prestes a competir com as soluções para livros baseadas em computação em nuvem que oferecem aos leitores uma melhor maneira de interagir com livro através das bibliotecas e plataformas digitais, livrarias onlineblogseBookStoresmarketplaces e as já populares plataformas de autopublicação.

Poucos empreendedores editoriais, no entanto, parecem saber como salvar seu antigo negócio deste cenário disruptivo ditado pela pandemia do novo coronavírus, afinal, nenhum de nós estávamos preparados para ela. Mas já não deveríamos estar preparados para as mudanças que a própria Internet já nos vinha mostrando desde a revolução das mídias digitais?

Pelo que tenho sentido, salvo casos raros aqui e ali, a postura da maioria dos empreendedores deste ramo com quem tenho conversado, se antes era de descrença generalizada no mercado digital, agora é a sua inaptidão para dar conta dela. Parece que vivem em um universo paralelo e ainda tentam a todo o custo manter o que parece, pelo menos é o que me parece, o pouco do que ainda conseguem do mercado editorial tradicional.

Às vezes penso: o que eu mesmo faria se estivesse no lugar deles?

Investiria em criar um novo projeto editorial, separado da empresa que já mantenho, que produzisse produtos mais leves, no sentido de mais baratos  e rápidos de se produzir, para capturar os clientes que já estão consumindo digitalmente. A estratégia central em meu ver é a de mover-se gradualmente para mercados digitais mais sofisticados; mercados que nos permita incubar uma nova empresa editorial que abrace o digital e concorra diretamente com sua própria empresa tradicional.

Até meados de 2011 eu mesmo era dono de uma empresa cujo sonho era ser uma editora do tradicional mercado de livros, ou seja, que investisse em um catálogo próprio, impresso, para tentar a sorte de que um best-seller caísse do céu. Mas resolvi, com muita coragem, mas também um pouco de sofrimento, vender minha parte daquela editora para entrar de cabeça no mundo digital o mais breve possível; pois sentia que a inovação disruptiva iria bater a nossa porta mais ou menos dia.

E foi exatamente o que aconteceu. Tempo depois, as distribuidoras começaram a devolver exemplares impressos e impedir que a gente enviasse novos exemplares. Presenciei não somente aquela editora tradicional que já não era mais minha, mais diversas outras, recebendo de volta milhares de exemplares das livrarias e distribuidoras e abarcando um fracasso de vendas atrás do outro. Se foi assim em meados de 2014 até 2017, imagine como andam as coisas agora?

Em 2013, fiz a seguinte previsão na página 242 do meu livro “A Revolução dos eBooks”, uma obra técnica sobre os livros eletrônicos e a sua influência na indústria editorial, publicada pela Sesi-Editora e indicada ao Prêmio Jabuti no ano seguinte:

Página 242 do livro “A Revolução dos eBooks”
Página 242 do livro “A Revolução dos eBooks”

Não podemos deixar de evitar previsões triviais. Em meados de 2020, talvez antes, teremos, em meu ver, uma retração econômica de dar medo. Posso estar exagerando, alguns diriam que isso é puro achismo, mas, se a minha previsão se concretizar, os livros impressos não serão mais comprados pelo governo. As escolas e os alunos terão não tablets, mas um ecossistema inteiro de bibliotecas digitais com base em tecnologia aberta. Assistiremos ao fim de uma era pela tela de um dispositivo portátil.

E a profecia se fez como previsto!

Mas, enfim, os aplicativos de leitura de livros digitais são hoje abarcados na maioria dos e-readerstablets e smartphones vendidos no mercado; isto, na prática, significa que os livros digitais estarão cada vez mais acessíveis a um mercado consumidor que aprendeu sozinho a comprar os produtos por meios digitais.

É tão óbvio que me causa constrangimento escrever isto como se o fizesse, a essa altura dos acontecimentos, por oportunismo. Mas quem acompanha meu trabalho sabe que mesmo antes desta disruptura acelerada ainda mais pela pandemia, eu já afirmava que a mudança no mercado editorial não vinha mais da nossa inaptidão de gerenciar os nossos negócios, ou da nossa incompetência coletiva de criar um marco regulatório para o nosso setor; tão pouco vinha de concorrentes dos mercados análogos, ou de empresas com um modelo de negócios aproximado ou similiar ao nosso. Mas, agora, neste novo e aterrador cenário, em poucas semanas, os consumidores fizeram a sua própria mudança no modo como acessam, consomem, armazenam e leem os livros.

Há uma ruptura sem volta num cenário pós-pandemia onde os consumidores modernos foram jogados para longe do consumo dos livros impressos. Todos os consumidores, de todos os segmentos, desertaram simultaneamente, e em massa, para o consumo das coisas por meio da Internet, todos os seus canais, e ali permanecerão no mundo pós-pandemia. Mesmo o consumo dos livros impressos passará pelas conexões que a Internet possiblita!

 Leia também O mercado editorial mundial pós-pandemia!

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